Fugi do Dom Casmurro na época do colegial e continuei fugindo na época do vestibular. Frequentei alguns contos de seu autor em tardes remotas e chuvosas - e gostei - mas não tomava coragem para alçar voos mais altos e encarar longas histórias. Na verdade, não sei bem o motivo, passei batido por todos os clássicos do Romantismo e Realismo brasileiro no período de escola. Não sei também como conseguia me virar nas provas mensais e bimestrais, mas o fato é que apesar da picaretagem, era tido como aluno razoável.
Agora, nesse janeiro de 2016, distante mais de uma década (quase duas) daquele estudante fujão que fui, resolvo enfim me dar a chance de conhecer de Machado de Assis algo além dos contos e do quase conto O Alienista. E é fatal começar pelo Dom Casmurro.
A história, ambientada no Rio de Janeiro da segunda metade do século XIX, é contada por seu próprio protagonista, o Bentinho, apelidado de Dom Casmurro por conta de sua pouca simpatia e de seu jeito sisudo e solitário. Após viver um amor juvenil com sua vizinha Capitu, nosso personagem principal é obrigado a ir ao seminário, devido a uma antiga promessa de sua mãe. Esse fato traz muito temor e ansiedade ao casal, que se vê separado e teme nunca mais se juntar, caso Bentinho realmente se torne padre. Mas isso não ocorre e os dois se casam e têm um filho. O autor/personagem vai contando toda essa história e busca, através da narrativa, além de relembrar seu passado, levar o leitor a, assim como ele, acreditar que Capitu cometeu adultério.
Como mero leitor em busca de diversão, elejo a parte que fala da juventude pré-seminário de Bentinho como a melhor do livro. A amizade colorida e varonil do protagonista com sua vizinha Capitu, tão poeticamente narrada, me deixou emocionado e saudosista. Fiquei com saudade do adolescente que não fui. Sempre a fugir de contatos mais próximos com as garotas por conta de uma timidez ainda não totalmente superada, fui furtado de ter qualquer experiência real minimamente parecida com as vividas por Bentinho com Capitu, mas nos meus sonhos e pensamentos, quantos momentos emocionalmente similares vivenciei.
A parte que mais me fez refletir sobre a vida e as relações, porém, foi mesmo a parte final, quando Bentinho passa a desconfiar da traição de Capitu com seu melhor (e talvez único) amigo, Escobar. Fica a cargo do leitor decidir se acredita que a traição realmente ocorreu ou não. Confesso que ainda não decidi categoricamente, mas acho mesmo que tudo foi obra da cabeça doentia e ciumenta do personagem principal da história. E penso isso porque hoje sei e vejo o quanto de amizade, amor, tempo e vida já perdi por ver coisa onde não tem. E sei que continuarei a perder, talvez um pouco menos, se Deus quiser e alguma literatura continuar ajudando.