Na parte do prefácio destacada na contracapa deste livro, o escritor argentino Alberto Manguel já nos anuncia uma história bonita, dizendo que "Cada personagem, que num convencional romance de viés documental ou sociológico seria um exemplo de injustiça social ou de transtorno psicológico, é na obra de Mãe um símbolo de libertação e triunfo pessoal, uma demonstração das infinitas possibilidades da alma e da imaginação humanas."
O primeiro capítulo (O homem que era só metade) nos traz a figura do pescador Crisóstomo, morador duma casa azul em frente ao mar, um homem que [...]"chegou aos quarenta anos e assumiu a tristeza de não ter um filho", dizendo pra si e pra quem pudesse ouvir que se sentia pela metade. Um dia rezou para a natureza, que sabe de tudo, pedindo encontrar um filho, já que dos seus amores fracassados não houvera brotado o fruto, e sentiu que a natureza, mãe de todos, o atenderia. Interessante a informação, adquirida em entrevistas do próprio autor, de que quando escreveu a obra, Valter Hugo se encontrava na entrada dos quarenta, assim como seu personagem, e também sentira mais que a vontade, a necessidade de ter um filho.
No capítulo dois (O filho de quinze homens) temos como personagem central uma anã. Habitante de uma pequena vila, a pequenina mulher, portadora de dores terríveis nos ossos principalmente durante as mudanças de estação, vive solitária em sua casa, mas recebe constantemente a visita das vizinhas, supostamente sempre preocupadas com a saúde e bem-estar da pequena. A anã compartilha um dia o desejo de ter um filho e as vizinhas estranham, assim como estranham ainda mais o fato da pequena possuir em seu quarto uma cama de casal de tamanho normal. Pensam as vizinhas que a anã deveria ter uma cama pequena e não uma cama grande onde coubesse um homem de tamanho normal. Quando a anã fica grávida, a vizinhança se afasta, com exceção do médico local, a quem a pequena confessa que pelo menos quinze homens da vila (inclusive os maridos das vizinhas 'cuidadosas') podem ser o pai da criança. Por que tivera relação com tantos? Se houve algum abuso ou se foi totalmente consentido fica a critério de cada leitor decidir, mas o fato é que ao dar a luz a anã morre. O velho Alfredo, viúvo de Carminda, que sempre quisera ter um filho, adota o bebê, chamado Camilo, para quem afirmará para sempre ser seu avô, a quem dará uma educação formal, afirmando que os livros podem mudar o mundo e curar doenças.
No terceiro capítulo (A mulher que diminuía) conhecemos a história de Isaura, a mulher enjeitada, filha de Maria, a mulher do sotaque afrancesado. Prometida em casamento ao vizinho, Isaura passa a namorá-lo com 16 anos. Resiste às investidas do rapaz -que dizia que não se casaria com ela caso não fizessem sexo antes do casamento - durante um bom período. Num dia de muito calor, em que cede à chantagem e a tentação, Isaura conhece o que ouviu chamar de amor e não gosta da experiência ensanguentada e dolorosa. Gosta menos ainda ao perceber que após o ato, seu noivo passa a desprezá-la e seus pais, ao descobrirem o ocorrido, pegam desgosto por ela e pela vida. Isaura entristece e emagrece. Era como se diminuísse.
O capítulo quatro (O filho da Matilde) nos apresenta Antonino, o filho da Matilde. Delicado e sensível, chamado de maricas pela população da vila, sofre várias violências ao longo de sua até então triste vida. Num dia em que andava próximo a um ribeirão e parou para ver os trabalhadores braçais se banharem, foi espancado por estes e sua mãe Matilde (que perdera o marido quando Antonino ainda era bebê) teve de ir buscá-lo. Ao chegar em casa, trancou-o no quarto como um prisioneiro, mostrando toda a insatisfação de ter um filho assim, maricas.
Esses quatro primeiros capítulos aparentemente são independentes e podem ser lidos, inclusive, em qualquer ordem. A partir do capítulo seguinte as histórias começam a se juntar. A história desses personagens marginais na vida real poderiam ter um desfecho trágico ou triste e comum. O que esperar de fato de um filho de uma anã morta no parto, adotado por um velho e novamente órfão aos 14 anos, sem nenhum familiar para lhe amparar? E de um homossexual que não é aceito nem pela própria mãe? De uma mulher que perdeu a virgindade antes de se casar e que não encontra mais nenhum pretendente, numa sociedade extremamente conservadora? De um pescador de 40 anos, sem filhos, sem família?
Valter Hugo Mãe, porém, mostra através de sua arte que a vida pode ser mágica e os finais felizes. Na junção dessas histórias, fazendo um resumo bem reduzido, apenas para que eu consiga me lembrar com detalhes do livro no futuro, o enredo fica assim: Crisóstomo encontra Camilo procurando emprego junto aso pescadores após a morte do velho Alfredo e adota o menino; Isaura, enjeitada por todos os homens se casa com Antonino mas este desaparece logo após a cerimônia, ainda na noite de núpcias; Isaura cai em tristeza e recolhimento; Crisóstomo deixa de ser metade e passa a se sentir inteiro com a presença do filho, mas ainda insatisfeito, passa a querer se sentir em dobro; Isaura se sente infinitamente triste e vai definhando, até que um dia sai da zona rural onde mora, atravessa a pequena vila e chega à praia, senta na areia e ora pra natureza; na praia, Crisóstomo encontra Isaura rezando e pelo fato dela estar sentada exatamente no local onde ele costuma orar, não lhe sobra dúvida de que ela é a mulher enviada que vai fazê-lo se sentir em dobro; forma-se então a família de Isaura, Crisóstomo e Camilo, que ainda conta com o Antonino, que volta do sumiço e é finalmente aceito. Há ainda o caso da caseira da Matilde e seu casamento malogrado com o velho Gemúndio; no almoço de casamento a caseira resolve matar a galinha mágica gigante de Gemúndio e acaba morrendo junto; com isso, a Matilde, que carrega o conflito de não ter criado corretamente o filho Antonino tem sua segunda chance e adota Mininha, a filha da caseira morta. Uma grande família é formada, então, por laços não consanguíneos. Uma família formada por laços de afetividade.
O que se destaca neste livro, além do rico enredo, do clima de esperança e do desfecho feliz, é a prosa poética do autor. Há também embutida na história uma crítica à sociedade a aos costumes. Mãe se deu o direito de ter seu momento esperançado. Já dizia Ferreira Gullar que a coisa mais fácil do mundo é ser pessimista. Valter Hugo Mãe escolhe a coisa difícil e cruza o caminho das pedras, encontrando a felicidade ao final e no caminho.
Esses quatro primeiros capítulos aparentemente são independentes e podem ser lidos, inclusive, em qualquer ordem. A partir do capítulo seguinte as histórias começam a se juntar. A história desses personagens marginais na vida real poderiam ter um desfecho trágico ou triste e comum. O que esperar de fato de um filho de uma anã morta no parto, adotado por um velho e novamente órfão aos 14 anos, sem nenhum familiar para lhe amparar? E de um homossexual que não é aceito nem pela própria mãe? De uma mulher que perdeu a virgindade antes de se casar e que não encontra mais nenhum pretendente, numa sociedade extremamente conservadora? De um pescador de 40 anos, sem filhos, sem família?
Valter Hugo Mãe, porém, mostra através de sua arte que a vida pode ser mágica e os finais felizes. Na junção dessas histórias, fazendo um resumo bem reduzido, apenas para que eu consiga me lembrar com detalhes do livro no futuro, o enredo fica assim: Crisóstomo encontra Camilo procurando emprego junto aso pescadores após a morte do velho Alfredo e adota o menino; Isaura, enjeitada por todos os homens se casa com Antonino mas este desaparece logo após a cerimônia, ainda na noite de núpcias; Isaura cai em tristeza e recolhimento; Crisóstomo deixa de ser metade e passa a se sentir inteiro com a presença do filho, mas ainda insatisfeito, passa a querer se sentir em dobro; Isaura se sente infinitamente triste e vai definhando, até que um dia sai da zona rural onde mora, atravessa a pequena vila e chega à praia, senta na areia e ora pra natureza; na praia, Crisóstomo encontra Isaura rezando e pelo fato dela estar sentada exatamente no local onde ele costuma orar, não lhe sobra dúvida de que ela é a mulher enviada que vai fazê-lo se sentir em dobro; forma-se então a família de Isaura, Crisóstomo e Camilo, que ainda conta com o Antonino, que volta do sumiço e é finalmente aceito. Há ainda o caso da caseira da Matilde e seu casamento malogrado com o velho Gemúndio; no almoço de casamento a caseira resolve matar a galinha mágica gigante de Gemúndio e acaba morrendo junto; com isso, a Matilde, que carrega o conflito de não ter criado corretamente o filho Antonino tem sua segunda chance e adota Mininha, a filha da caseira morta. Uma grande família é formada, então, por laços não consanguíneos. Uma família formada por laços de afetividade.
O que se destaca neste livro, além do rico enredo, do clima de esperança e do desfecho feliz, é a prosa poética do autor. Há também embutida na história uma crítica à sociedade a aos costumes. Mãe se deu o direito de ter seu momento esperançado. Já dizia Ferreira Gullar que a coisa mais fácil do mundo é ser pessimista. Valter Hugo Mãe escolhe a coisa difícil e cruza o caminho das pedras, encontrando a felicidade ao final e no caminho.
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