Meu primeiro contato com a escrita de Daniel Galera foi através do
seu Mãos de Cavalo. Na época em que li (2008 ou 2009, acho) eu era frequentador
constante do SESC Araraquara. Pegava a bicicleta e saía da Avenida Augusto de
Campos, quase no extremo leste da cidade, rumo ao SESC, lá do outro lado do
mapa (pouco mais de 6 km, vejo agora). Prendia a bike com a corrente envolta
por uma proteção de borracha de mangueira feita pelo meu pai no bicicletário do
clube e ia até a biblioteca dar uma folheada nos jornais.
Num desses dias passei os olhos com atenção pelos livros
disponíveis para retirada na parte da estante de madeira reservada à literatura
nacional. O título Mãos de Cavalo me chamou a atenção imediatamente. Retirei-o
da prateleira e a arte da capa¹, que a princípio me pareceu a imagem de um
retorcido emaranhado de ossos secos, me arrebatou de vez. Peguei o livro
emprestado.
A leitura do primeiro capítulo, O Ciclista Urbano, não fluiu fácil
de primeira. A riqueza de detalhes me fez resistir por breve momento. Fazia
tempo que não me entregava de verdade a um livro e acho que aquela resistência
inicial pode ter sido uma espécie de auto boicote ou de fuga. Livros podem
doer, podem deixar marcas pra sempre, podem mudar rumos e nos levar pra
caminhos e paisagens que não estamos preparados pra percorrer e ver.
Depois que a leitura engrenou, entretanto, eu poderia ter lido
tudo numa tacada só. Mas demorei alguns dias, pra poder digerir bem os
capítulos tão ricos em imagens e tão chocantes. Lia um capítulo, repassava,
ficava degustando as sensações trazidas, cicatrizando os impactos e depois
seguia em frente. Levei uma semana ou dez dias pra terminar as duzentas páginas
nesse saborear sofrido.
Hermano, o protagonista, é retratado no livro em três fases da sua
vida (infância, adolescência e vida adulta). A história vai e volta. Pula da
infância pra adolescência e pra vida adulta (não necessariamente nessa ordem),
depois volta e assim por diante.
Me envolvi muito com a história. A jornada de Hermano em busca de
identidade e, posteriormente, de redenção, é, certamente, e de certa forma, a
jornada de todos nós, criados nos anos oitenta, nas capitais ou no interior.
Desde sua versão criança - desbravando a parte que lhe cabe da Porto Alegre de
sua infância perigosamente montado em uma bike - passando por sua versão
adolescente - que numa partida de futebol entra de sola no vilão do momento e
depois se acovarda - fechando em sua versão adulta - profissionalmente bem
sucedido - a busca de identidade e sentido nunca cessou. Será que em nossas
vidas reais essa busca e necessidade um dia cessará? Continuemos vivendo a vida
e os livros! Esse Mãos de Cavalo vale a pena!
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