20 de nov. de 2018

Mãos de Cavalo - Daniel Galera

Meu primeiro contato com a escrita de Daniel Galera foi através do seu Mãos de Cavalo. Na época em que li (2008 ou 2009, acho) eu era frequentador constante do SESC Araraquara. Pegava a bicicleta e saía da Avenida Augusto de Campos, quase no extremo leste da cidade, rumo ao SESC, lá do outro lado do mapa (pouco mais de 6 km, vejo agora). Prendia a bike com a corrente envolta por uma proteção de borracha de mangueira feita pelo meu pai no bicicletário do clube e ia até a biblioteca dar uma folheada nos jornais.

Num desses dias passei os olhos com atenção pelos livros disponíveis para retirada na parte da estante de madeira reservada à literatura nacional. O título Mãos de Cavalo me chamou a atenção imediatamente. Retirei-o da prateleira e a arte da capa¹, que a princípio me pareceu a imagem de um retorcido emaranhado de ossos secos, me arrebatou de vez. Peguei o livro emprestado.

A leitura do primeiro capítulo, O Ciclista Urbano, não fluiu fácil de primeira. A riqueza de detalhes me fez resistir por breve momento. Fazia tempo que não me entregava de verdade a um livro e acho que aquela resistência inicial pode ter sido uma espécie de auto boicote ou de fuga. Livros podem doer, podem deixar marcas pra sempre, podem mudar rumos e nos levar pra caminhos e paisagens que não estamos preparados pra percorrer e ver.


Depois que a leitura engrenou, entretanto, eu poderia ter lido tudo numa tacada só. Mas demorei alguns dias, pra poder digerir bem os capítulos tão ricos em imagens e tão chocantes. Lia um capítulo, repassava, ficava degustando as sensações trazidas, cicatrizando os impactos e depois seguia em frente. Levei uma semana ou dez dias pra terminar as duzentas páginas nesse saborear sofrido.


Hermano, o protagonista, é retratado no livro em três fases da sua vida (infância, adolescência e vida adulta). A história vai e volta. Pula da infância pra adolescência e pra vida adulta (não necessariamente nessa ordem), depois volta e assim por diante.


Me envolvi muito com a história. A jornada de Hermano em busca de identidade e, posteriormente, de redenção, é, certamente, e de certa forma, a jornada de todos nós, criados nos anos oitenta, nas capitais ou no interior. Desde sua versão criança - desbravando a parte que lhe cabe da Porto Alegre de sua infância perigosamente montado em uma bike - passando por sua versão adolescente - que numa partida de futebol entra de sola no vilão do momento e depois se acovarda - fechando em sua versão adulta - profissionalmente bem sucedido - a busca de identidade e sentido nunca cessou. Será que em nossas vidas reais essa busca e necessidade um dia cessará? Continuemos vivendo a vida e os livros! Esse Mãos de Cavalo vale a pena!


1-A capa, na verdade, é a foto de galhos - e não de ossos -, retirada dos arquivos do fotógrafo americano já falecido Brett Weston

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